"Conhecer"

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Ela sempre gostou de conhecer pessoas. Não que confiasse particularmente nelas, mas tinham sempre despertado em si uma aguçada curiosidade. Quando era pequena, dava por si a observá-las, a imaginar-lhes vidas e a traçar-lhes perfis. Muitas vezes ao lado. Outras vezes em cheio. Considerava-o um exercício bastante fascinante.


Hoje, ela sabe que na correria do quotidiano há muita gente que atravessa a sua vida em modo relâmpago. Aparecem e desaparecem à velocidade da luz. E é pena, em alguns casos. Se lhe interessam, por qualquer particularidade (que pode variar muito), gosta de mantê-las na sua esfera, mesmo sem conhecê-las ainda muito bem. Aproxima-se, sem pressa, e vai construindo uma amizade ou uma qualquer relação de confiança que traga algo importante às duas partes. Importa que acrescente alguma coisa: uma ideia, um sorriso, um ponto de vista diferente. Há sempre um consentimento tácito, quando duas pessoas se permitem conhecer, sublinha. Posteriormente, existem barreiras que se vão quebrando e outras que se vão construindo, se porventura o caminho começa a bifurcar. E não tem de ser um drama, se seguirem caminhos diferentes, remata de imediato. Aliás, é essa a magia: a infinitude de possibilidades que aquela proximidade pode originar. E o seu significado, para cada uma das partes.

"...é essa a magia: a infinitude de possibilidades que aquela proximidade pode originar."

Naquele dia, quando nos encontrámos, constatou que quando nos mudamos para um novo sítio ou cruzamos outros circuitos, o potencial de novos contatos é imenso. Assim como é enorme a triagem que muitas vezes fazemos, logo ao início, entre aqueles que nos parecem dignos de maior atenção. Por vezes o seu crivo falha. Na maioria dos casos, já se encontra calibrado para evitar frustrar expectativas. Ela bem sabe que há quem prefira manter a sua esfera de amizades e pouco ir acrescentando, alegando falta de tempo. Mas, indubitavelmente, prefere acreditar que essas pessoas que vai conhecendo e que de alguma forma a interessam podem ensinar-lhe qualquer coisa, podem trazer-lhe novas perspetivas. E tal tem-se verificado, felizmente, muitas vezes, acrescenta com um sorriso.


Por isso, disse-me, com a maior naturalidade, que nela paira um certo descontentamento instalado por todos aqueles que não se permitiu conhecer, por todos os que nunca atravessarão a sua vida e ainda por aqueles que saíram dela (felizmente muito poucos) por qualquer circunstância fortuita. E isto contrasta com a sorte que sente em conservar pessoas importantes na sua vida, que nela entraram por convicção ou que simplesmente foram o resultado de um mero (mas bonito) acaso.

Publicado no dia 22/01/2021 por Diana Andrade